Uma análise contundente sobre os serviços de streaming

VOCÊ NÃO TEM IDEIA DE O QUÃO F@#$% O STREAMING REALMENTE É

De medium.com por Nora Germain
Traduzido por Leo Mendes

OK, isso pode ter soado um pouco duro. Mas quanto mais você olha, pior é. Eu tenho sido música toda a minha vida, profissional nos últimos 10 ou mais anos, e a maioria dos meus amigos não tem ideia de como todos nós somos ferrados (sim, alguns deles são celebridades). Eles apenas aceitam o status quo e seguem em frente.

Esta semana todos estavam postando suas estatísticas do Spotify nas mídias sociais, e enquanto eu trabalhava com vários artistas que tinham muitos bons “números” e orgulhosa do engajamento que todos nós alcançamos, fiquei perplexa com a quantidade de artistas e amantes da música que não sabem e não se importam com o que aconteceu com a indústria musical. Eu entendo – é um assunto complicado, e há muitas pessoas que tentam explicar isso todos os dias. Estamos todos tentando, e talvez alguns de nós façam progressos.

Pessoalmente, gosto de explicar as coisas em termos de metáforas. Será que metáforas podem ajudar as pessoas a compreenderem o absurdo de uma situação como a economia de streaming (e-comédia)? De qualquer forma, obrigado por estar aqui.

Aqui está uma metáfora. Vamos fingir que todas as lojas que vendem roupas disseram aos estilistas que não poderiam mais vender suas roupas nas lojas. As roupas estariam disponíveis gratuitamente, e aqueles que quisessem pagar uma taxa fixa para “se inscrever” para comprar roupas novas e criativas pagariam uma taxa. De qualquer forma, as lojas disseram aos designers que poderiam ganhar dinheiro vendendo ingressos para seus desfiles de moda, e foi isso. Os designers disseram: “OK! Parece ótimo!” Tudo estava bem no mundo.

É quase como o que fizemos na indústria da música. Eu vejo pessoas andando por aí com fones de ouvido de US$ 300, com fones de ouvido e alto-falantes bluetooth de última geração e todos os outros dispositivos que não podem esperar para colocar as mãos (ou tirar as mãos!), mas quando se trata do que sai desses dispositivos, a música em si – eles querem isso de graça. O que isso me diz é que toda a indústria da música está completamente de cabeça para baixo. As pessoas estão ganhando dinheiro em todos os tipos de negócios relacionados à indústria da música. Exceto na própria música.

Agora eu sei que vai haver algumas pessoas que estão chateadas porque eu disse isso. Há bilhões de dólares sendo feitos devido ao streaming, e embora o Spotify e outros serviços de streaming continuem afirmando não ter lucro e distribuam uma grande parte de seus ganhos para gravadoras (que possuem partes dos serviços de streaming), não há como negar que existem muitos artistas que foram descobertos via streaming e que de outra forma não teriam sido. Estou muito feliz com isso. O engajamento é ótimo. É a questão econômica, o valor colocado na música, essa é a questão.

Eu já disse em outros textos que não há versão gratuita do Netflix. A razão pela qual a Netflix foi capaz de se tornar uma das empresas de internet mais valiosas da última década foi porque eles (juntamente com toda a indústria cinematográfica e televisiva) não permitiram que a pirataria inicial do Napster e de outras plataformas os assustasse pra fazerem seu produto grátis. A indústria da música fez isso, no entanto, o que levou a alguns eventos muito chocantes.

Aqui está um infeliz: quando o iTunes terminar os downloads em 2019, não haverá mais uma loja de música. Apenas não haverá. Não haverá um lugar centralizado para você receber música de qualquer artista. Você pode encontrar em seu site pessoal ou em outro lugar, mas as coisas vão mudar. Há debates sobre quando o iTunes vai oficialmente fazer isso, mas não há dúvida de que está chegando. Nos últimos dois anos, vi que os links do iTunes agora são abertos no Apple Music, o que significa que você não pode mais se vincular à loja do iTunes, se quiser. As pessoas apenas começarão a ouvir suas músicas na Apple Music (quem sabe como elas chegaram lá?!) e irão enviar uma mensagem de texto para você e dizer: “Eu queria comprar, mas começou a tocar.” Essas são difíceis palavras pra ouvir como artista.

Como eu estava dizendo, há pessoas (artistas reais, não apenas corporações) ganhando dinheiro com música, mas não estão fora da música. Se você é um artista e quer viver como classe média ou maior do que a classe média vive, você vai ter que fazer muitas turnês. Fazer turnê é incrível, mas para mim não conta mais como a indústria da música, não como costumava ser. Do jeito que as coisas são hoje em dia, um músico agora está ganhando dinheiro no setor de “eventos ao vivo”, o que significa que músicos estão competindo com pessoas que querem ver jogos de basquete e todo tipo de entretenimento. Não é realmente a indústria da música.

Tenho amigos que perguntam sobre como ter música em programas de TV e fazer outras transações como essa. Bem, isso pode acontecer, mas como o streaming levou o preço da música a um patamar zero, muitos programas de TV exigem que eles também recebam sua música de graça, mesmo que seja transmitida pela televisão nacional. Ouvi falar de pessoas sendo convidadas para tocar músicas nos maiores shows da TV gratuitamente. A palavra mágica é “exposição”. Se você não está disposto a “se expor” ao seu público, existem outros 100 artistas por aí que são. Eles só encontrarão alguém que diga sim.

Além disso, tem havido um meme por aí que usa as estatísticas do Spotify que artistas como eu recebem por e-mail depois que nossas plays do ano foram compiladas. Em vez de Spotify, ele diz: “Suckers”. Agora é importante saber que não estou apontando o dedo para qualquer pessoa ou serviço de streaming. Essa é uma questão de toda a indústria (crise?), mas é importante ver como a transmissão de dados realmente é. Então aqui está:

Como o meme explica, se você quiser fazer um salário mínimo, você precisa obter mais de 1 milhão de plays. Mas isso não é correto, porque para 1 milhão de plays você provavelmente ganha cerca de US$ 4.000. Isso não é suficiente para viver por um ano na América. O salário mínimo, calculado generosamente em US$ 15 por hora (que é o que deveria ser!), 40 horas por semana, faz com que você ganhe US$ 2.400 por mês. Mas você só recebe US$ 4.000 do Spotify se não estiver dividindo o dinheiro entre produtores, co-autores ou outros membros do seu grupo. Artistas fazem algo entre 0,004 e 0,008 centavos por stream, o que significa que você recebe algo como 1 ou 2 centavos por cada 250 streams. Não sabemos qual é a taxa oficial. Essa é outra conversa, mas a ambigüidade leva a alguns números ainda mais chocantes.

Se você recebe streams de 1M no Spotify e ganha US$ 4.000, depois que ele é dividido entre os colaboradores e talvez uma gravadora e quem mais tiver, você pode acabar com quase nada, o que acontece com muitos artistas. Mesmo os grandes. Mas na verdade fica pior. A Digital Music News relatou isso em setembro de 2018: “As músicas transmitidas no nível de anúncio da empresa neste ano renderam US $ 0,00014123 em mecânica por streams.” Sim. Eu disse. Pior do que você pensou.

Aqui está outra notícia: A fama não paga as contas! Até que, enquanto sociedade, descubramos como honrar o sacrifício, o trabalho, a criatividade e a experiência de fazer música, isso não mudará. Existem muitas maneiras possíveis de ganhar a vida ou de ganhar a vida como músico, no entanto, vender a sua música não deve estar fora da mesa.

Eu tenho me empolgado com soluções baseadas em blockchain para esses problemas. Resonate, Mycelia e Rchain (três empresas com quem trabalhei) e outros fizeram um grande progresso em educar pessoas e propor soluções. Mas, devido à recente crise de criptografia que todos esperamos que seja temporária, esses projetos, por si só, não serão capazes de nos salvar agora ou no futuro. Nós, como o público, devemos nos preocupar em como tratamos nossos amigos, nossos colegas e nós mesmos. Através de uma mudança na consciência do público, essas soluções serão bem-vindas.

É surpreendente para mim perceber quantos ávidos amantes da música e produtores de música não querem entrar em nada disso, e eu entendo o porquê. É uma grande indústria com muita história e muita energia. Os fatos são difíceis de entender, mas poderíamos dizer isso sobre o governo, sobre a mudança climática, sobre qualquer faceta da vida humana. Vamos apenas sentar e nos permitir ser roubados? Para sempre? Como a convidada do Make Weird Music, Sara Groves, declarou recentemente: “O que acontece no dia do lançamento do álbum? Oh, esse é o dia em que seu álbum é de graça!”

Eu, pelo menos, não estou disposto a aceitar isso. Eu sei que estamos em uma fase evolucionária no planeta Terra, com relação a muitos problemas, mas acredito que se os artistas puderem educar seus públicos e fazê-los entender o quanto é errado receber US$ 100 por 700K quando seus fãs pagam US$ 300 por novos fones de ouvido a cada dois anos, possamos fazer algum progresso e construir algo novo.

A música é o maior auto-organização, curativa, e presente mágico de dividir-pra-conquistar que os humanos possivelmente já inventaram (ou encontraram, dependendo da sua visão sobre isso). É importante que honremos isso, honremos as pessoas que a fazem e recompensemos a criatividade pela medicina social que é. Não há razão para forçar os artistas a morrer de fome porque algumas empresas querem obter uma fatia maior de suas receitas. 2018 viu um aumento de riqueza indo para o topo, e nossa indústria é parte dessa tendência. Espero que, se a música o tenha tocado em sua vida, esteja disposto a tomar uma posição e concordar que os músicos merecem ser capazes de ganhar a vida. Vejo você em 2019.