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‘Fyre Festival Brasil’: bastidores de um Réveillon lamacento em Paraty
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‘Fyre Festival Brasil’: bastidores de um Réveillon lamacento em Paraty

DE ACORDO COM FREQUENTADORES FESTIVAL FOI A VERSÃO BRASILEIRA DO FYRE NAS BAHAMAS

De TAB-UOL
Por Mateus Araújo

A ideia de Rafael Gonzaga, 30, era esperar a chegada de 2022 em Boipeba, litoral sul da Bahia, numa festa chamada Mareh NYE. Mas ele desistiu do plano assim que descobriu um imbróglio entre a produção do evento e a prefeitura de Cairu, onde fica a ilha. Em 2020, a Justiça proibiu o Réveillon naquela região por causa da pandemia e, em 2021, o município indeferiu todos os pedidos de licenciamento de eventos no local. Os responsáveis pela Mareh, então, levaram a programação para uma praia vizinha.

Antes mesmo de saber dessa mudança de endereço, com medo de perder dinheiro ou ficar sem ter para onde ir na virada do ano, Rafael vendeu o ingresso que já havia comprado e escolheu outro destino: um festival de música eletrônica, em Paraty, no Rio de Janeiro.

“As pessoas estavam falando super bem [do evento], tinha um line-up muito legal. Eu e meu namorado compramos os ingressos por cerca de R$ 2 mil por pessoa, no pacote que incluía duas festas de open bar e mais quatro dias de evento”, lembra o jornalista.

O Festival Xama, com mais de 30 atrações, foi realizado ao longo de sete dias — foram várias festas, quatro delas em um hotel, outras quatro em um barco e seis em uma área afastada do centro histórico da cidade, onde só era possível chegar de van mais um trecho de trilha à pé. No entanto, uma série de problemas terminaram tirando a paciência e causando transtorno ao público majoritariamente jovem. A começar pelo lamaçal em que se transformou um dos locais do evento. “Eu me arrependi amargamente disso”, reclamava Gonzaga, dois depois de voltar para casa, na capital do Rio.


Festival aconteceu em Paraty, no Rio de Janeiro, com uma semana de eventos – Divulgação

Sem trilha, sem copos, sem drinks

Um temporal atingiu Paraty na última semana do ano. Em 30 de dezembro, a Defesa Civil local chegou a divulgar um balanço de enchentes, quedas de árvores e muros, suspensão do fornecimento de energia e fechamento de rodovias, causados pela chuva da tarde daquela quinta-feira. O nível pluviométrico variou de 30 mm a 90 mm por hora em vários bairros. No dia seguinte, véspera do Ano Novo, o órgão anunciou que o município se encontrava em estado de atenção. A previsão era de 40 mm de chuvas.

A tempestade prejudicou o Festival Xama — sobretudo as duas maiores festas do evento, nos dias 29 e 31, que tinham como grande chamariz bebida à vontade e aconteciam justamente no espaço mais distante do centro. Além da desorganização generalizada, a estrutura, segundo Rafael Gonzaga, não levou em consideração o clima deste período do ano na região.

Na quarta-feira, depois de um atraso de mais de quatro horas, o público foi avisado do cancelamento da programação que começaria às 17h. “Só o bar estava funcionando, mas sem DJ, sem nada. Depois de muita espera, uma pessoa pegou o microfone e avisou do cancelamento, disse que ia reembolsar o dinheiro”, conta Rafael Gonzaga.

Ao TAB, os produtores do Xama explicaram que “o cancelamento de algumas das festas programadas se deu por motivos alheios a nossa vontade, e por mais que tenhamos empregado nossos melhores esforços no sentido de realizá-las”. Conforme apurou a reportagem, o alvará de liberação do evento não foi expedido em tempo da festa do dia 29. No burburinho entre o público, comentava-se que a ordem de suspensão partiu de uma milícia — o que foi negado pela produção do evento.

Na sexta-feira, com mais chuva, veio um novo perrengue: prontos para receber 2022, ao chegar no Xama, todo mundo se deparou com uma paisagem de mangue no lugar da festa.

“Foi uma completa falta de profissionalismo”, definiu Gonzaga. “Os problemas foram inúmeros. A começar pelo acesso extremamente perigoso para o evento, que era por meio de uma trilha. Por conta da chuva, esse caminho parecia uma cachoeira, e eu conheci uma menina que caiu e ficou com hematomas. Além disso, não havia áreas cobertas suficientes, o gramado virou um lamaçal, com risco muito grande de acidentes. Não tinha banheiro, e no final do evento acabaram os copos, não tinha nem os itens que estavam prometidos no open bar.”


‘Povo gosta de uma fofoca’

A frustração de um Réveillon na lama virou piada nas redes sociais tão logo as pessoas acordaram após a festa em Paraty. “Como fofoqueira de plantão, está aqui a thread de acontecimentos do Xama 2022, mais conhecido como festival de gays na lama, lama sobre tela”, escreveu a redatora Thatiana Quinqueto, no dia 2 de janeiro, num post do Twitter que viralizou. Ela se referiu ao evento como “Fyre Festival Brasil”, em referência ao festival britânico que em 2017 ficou conhecido por “perrengues” na organização e ganhou uma série documental homônima na Netflix.

Quinqueto escolheu passar o Ano Novo no festival com um grupo de 14 amigos que, como ela, curte música eletrônica. “Já fomos a algumas festas desse pessoal, e elas costumam ser muito boas, têm uma ótima estrutura”, explica a redatora, que para chegar ao evento pegou um barco disponibilizado pela produção.

“O Revéillon, em si, foi animado e divertido”, pondera a redatora, mas o lamaçal era frustrante. “A gente nunca imaginaria que seria tão difícil andar, tentar não se sujar e acessar o banheiro. Um gramado na chuva não ia dar bom, ainda mais numa festa que não era toda coberta.”

O post que Thatiana Quinqueto fez nas redes sociais — e que já ultrapassa 22 mil curtidas — terminou reunindo dezenas de outras reclamações e imagens da festa feitas por pessoas que estavam lá, mostrando a situação. “Depois que eu fiz o fio, ele acabou tomando proporções bem maiores do que eu imaginava. Eu escrevi mais como uma piada entre amigos. Eu queria falar de uma forma mais engraçada e com um pouco de humor sobre o que aconteceu. Acho que o povo gosta de uma fofoca. No fim, é um pouco engraçado, apesar de tudo que aconteceu”, diz ela, que também vai solicitar reembolso parcial do ingresso, porque o festival “não entregou o prometido em termos de de estrutura”.


Posicionamento

Em nota à reportagem, a organização do Xama afirmou ter ciência de que o evento não aconteceu da forma esperada. “Infelizmente não foi possível entregar o festival como gostaríamos”, diz o documento. Segundo eles, a estrutura do evento foi impactada pelo volume “inesperado” de chuvas que atingiu Paraty durante aqueles dias.

“Apesar disso, fizemos os devidos ajustes durante o evento (o que foi ampla e devidamente divulgado em nossas redes sociais) para possibilitar a melhor experiência possível diante da intensidade das adversidades alheias à nossa vontade, tanto que boa parte das festas programadas transcorreram normalmente”, argumentou a produção.

O grupo explicou também que, no dia 31, “uma quantidade grande de copos biodegradáveis de papel foi danificada pela chuva” e, por isso, algumas pessoas reclamaram da falta de copos na festa. No entanto, negou que tenha faltado bebida em qualquer dia do festival. “Além disso, transformamos algumas festas em open bar, já como forma de compensação para o público.”

Ainda de acordo com os responsáveis pelo festival, a trilha de acesso às festas afastadas do centro era o único acesso à praia onde seriam realizados alguns dos eventos, e foi extremamente danificada pelas chuvas. “No dia 30, a tempestade começou praticamente junto com o início da festa, dia em que a trilha ainda era a única opção de acesso. No dia 31, nossa produção contratou 6 barcos para fazer o transfer das pessoas, evitando assim que precisassem passar por aquele caminho.”

Sobre o reembolso dos ingressos, a organização do festival diz que “já comunicou aos clientes que irá trabalhar em um cronograma para este ressarcimento”. A promessa é de que todas as pessoas receberão as instruções até 14 de janeiro.

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